Após uma pequena
peregrinação nas recepções do hospital, dirijo-me ao segundo andar. UTI
neonatal. Uma realidade difícil de admitir, mas precisa existir um lugar como
esse. Melhor se não precisasse. Mas a vida é assim, e muitas vezes o real não
coincide com o melhor.
Chego apreensivo. Será que serei permitido entrar?
Inseguro, toco a campainha levemente... Não vou insistir... talvez nem devesse
tentar. Mas já que vim... Para minha surpresa, a resposta foi rápida: “Sim,
senhor, posso ajudar?”, saudou-me uma enfermeira simpática. “Queria saber notícias sobre um garotinho,
Arthur, que recentemente fez uma cirurgia. Ele ainda está internado?”A
enfermeira respondeu afirmativamente e acrescentou: “O Davi também está aqui”. Fiquei surpreso, pois julgava que
somente um dos gêmeos ainda estivesse internado. “Os pais estão aqui?”. “Ainda
não chegaram”. Fiz mais algumas perguntas, agradeci e me dirigi à porta de
saída. Não achei conveniente sequer insinuar que queria ver as crianças. Esse é
um lugar verdadeiramente sensível. Um visitante pode representar um sério risco
para os pequenos pacientes. E trazer qualquer pequeno risco para os meus
amiguinhos nascidos de cinco meses era a última coisa que queria. “Posso orar por eles em casa”,
consolei-me.
De repente, uma mudança de planos. Numa incrível
coincidência, quando girei a maçaneta da porta pelo lado de dentro, outra
pessoa fez o mesmo pelo lado de fora. Uma sincronia milimetricamente calculada.
Era o pai e mãe dos gêmeos. Nesses momentos precisamos ter cuidado para não
pronunciar um descuidado “tudo bem?” Consegui. Deixei que o meu abraço
substituísse a saudação inicial. Expliquei que já estava saindo, mas eles me
garantiram que eu os podia acompanhar para ver as crianças. E começamos o
ritual de preparação. Mãos bem lavadas e desinfetadas, batas, máscaras, etc.
Antes de entrar a mãe compartilhou: “Eu
nunca entro primeiro... é sempre ele”. Entendi a mensagem. Se houver algo
anormal e triste, a mãe não quer ser a primeira a saber. Que bom que Deus dá ao
marido coragem para ir adiante de sua esposa em qualquer situação. A coragem do
pai e a ternura da mãe formam uma divina combinação para o equilíbrio conjugal.
Ainda conservando o bom o humor, o esposo me disse: “Eu brinco com ela dizendo: eu vou na sua frente, mas quem vai adiante
de mim?”. Era óbvio que nós três sabíamos a resposta... “Deus vai adiante de você”, falei. “Eu sei,
pastor”, disse o marido com segurança.
Davi e Arthur são vizinhos de incubadora. Os olhinhos são
protegidos contra a luz, tubo de oxigênio à boca e os eletrodos monitorando
respiração e coração. Vendo que estão reagindo bem, os pais ficam mais à
vontade e me apresentam os filhos. Davi é loirinho e de pele muito clara. “Esse puxou à mãe”, disse-me o pai. E
continuou... “O Arthur é mais parecido
com minha família”. De fato. Apesar de serem tão pequenos, dá para notar a
diferença. Um nasceu com pouco mais de setecentos gramas, e o outro com pouco
mais de novecentos. Com o tamanho aproximado de dois palmos. O Arthur, devido a
dificuldades no parto já teve que se submeter a três cirurgias. Sobre o seu
corpinho, dá para ver, entre os fios e sondas, as cicatrizes da última
intervenção cirúrgica. Louvado seja Deus pelo desenvolvimento científico e
pelos modernos recursos da tecnologia, pelos quais crianças assim conseguem
receber a assistência que precisam.
O casal explicou-me tudo que estava sendo feito,
conscientes da dificuldade, mas nutrindo grande esperança. A mãe descreveu bem
as características de cada um: “O Arthur
é mais calmo, mas o Davi é agitado. Quando
ele ouve a minha voz se mexe e as pulsações cardíacas se alteram”. Incrível
a ligação entre mãe e filho. Ela sabe bem como se aproximar de cada um. Abriu
as travas da incubadora do Arthur, introduziu as mãos devagar, acariciou a cabecinha
e falou suavemente: “Arthur... mamãe”.
Com os olhos eu contemplava, com o coração sentia, com a mente orava: “Ó Senhor, recupera o Arthur para a Tua
glória e para a felicidade do coração dessa mãe”. Foi muito emocionante.
Como é incrível o amor que enche o coração de uma mãe!
Chegada minha hora, aproximei-me do casal para orarmos
juntos. Com o coração apertado, despeço-me e saio pensativo... devagar e
divagando.
Davi, Arthur, Gisele, Mazinho, minha mãe, minha esposa,
meus filhos... meu Deus. Todos se encontram e interagem
nos meus pensamentos. Fora do hospital, o mundo me pareceu ainda mais estranho.
É sábado, mas os carros correm... a vida corre. Por que correr? Vale à pena? E
os filhos? Muitos têm filhos que podem brincar, correr e conversar... que
bênção ter filhos... mas onde eles estão? E a vida passa, e continuamos
correndo para longe. Longe de casa, longe da esposa, longe dos filhos, longe
dos pais, longe, sempre cada vez mais longe... Até quando? Mas Davi, Arthur e seus pais estão juntos...
o mais que podem... na UTI neonatal... todos os dias juntos! Que bom se os
casais, os pais e os filhos aprendessem a bênção de ficar juntos.
“Davi
e Arthur, no silêncio vocês me falaram muito, jamais lhes esquecerei. Espero
vê-los em breve, em casa, correndo, sadios e felizes. Vocês me ensinaram a
louvar mais a Deus... por que Ele é soberano, pela beleza da união conjugal,
pela família que Ele me deu, por vocês mesmos. Não desistam. Vocês estão
cercados pela coragem do seu pai, pelo afeto indescritível da sua mãe e pela
graça e misericórdia do Pai celeste”.
Estamos
juntos. Estaremos juntos. Deus está conosco.
A serviço do Mestre,
Pr. Jenuan Lira.