quarta-feira, 30 de maio de 2012

O HOMEM NO LIXO


Por diversas vezes, no meu habitual percurso pelo centro da cidade, algo me chamava a atenção: em todas as calçadas de lanchonetes e pequenos restaurantes os sacos de lixo estavam sempre rasgados. A estranha cena e seu odor desagradável ativavam minha imaginação em busca de uma explicação para tanta sujeira a céu aberto.

      Certa tarde, andando pelas mesmas calçadas, repentinamente desvendou-se o mistério. Fiquei surpreso e chocado, quase sem aceitar a realidade diante dos meus olhos. Não podia imaginar que um homem tinha a repugnante ocupação de rasgar todos aqueles sacos a fim de coletar restos de alimentos já fermentados. E pior: a separação dos elementos da imunda mistura era feita com as próprias mãos. Além disso, outro fato me surpreendeu ainda mais: a naturalidade com que o homem mergulhava as mãos no lixo. Nas suas feições e reações não se percebia o menor sinal de repulsa. Sem luvas e sem proteção no nariz, o homem mexia e remexia toda imundície dos sacos como um pedreiro revolve a argamassa, naturalmente. Passei pelo homem, mas não esqueci a cena: O homem, os sacos, as mãos, o cheiro, tudo se misturava na superfície e nas profundezas dos meus pensamentos. Agora, sempre que recordo a tranquilidade do homem no lixo, chego à mesma conclusão: quem vive com as mãos metidas no lixo fica insensível à imundície.
Estou certo de que essa estranha falta de sensibilidade é fato no mundo físico e moral, mas principalmente no espiritual. Pelo menos é o que se nota no primeiro capítulo do profeta Isaías. Ali percebe-se uma repugnante cena de "lixo" espiritual, na qual os seus protagonistas não demonstram a menor sensibilidade. Viviam tão atolados no pecado que sua condição espiritual é descrita em palavras que evocam imagens nojentas e repugnantes: "Desde a planta do pé até à cabeça não há neles coisa sã, senão feridas, contusões e chagas inflamadas, umas e outras não espremidas, nem atadas, nem amolecidas com óleo" (Isaías 1.6). As palavras são fortes e fotográficas. Tente, se conseguir, imaginar com clareza um corpo semelhante à descrição acima.
O povo de Israel, à época do profeta Isaías, vivia se revolvendo no pecado como porco em lamaçal. E estava tão condicionado ao "lixo" que não conseguia sequer sentir o forte odor que exalava dos seus pecados. Era um povo degradado que ainda tinha a coragem de se aproximar de Deus, como se o Senhor pudesse conviver com os "resíduos fermentados" dos seus pecados. Sem o menor constrangimento falavam de Deus como se tivessem em perfeita comunhão com Ele. Eram assíduos em seus sacrifícios, mas o aroma dos seus incensos causavam náuseas ao Deus santo, que se declara enojado com o odor de podridão que contaminava seus sacrifícios. Por isso, assim diz o Senhor : "De que me serve a multidão dos vossos sacrifícios? ...Não continueis a trazer ofertas vãs... a minha alma aborrece as vossas solenidades... estou cansado de as sofrer"(Isaías 1.11,13,14).
Eis a razão da analogia entre o homem no lixo e o homem no pecado. Uma vez que se decidiram viver na sujeira, ambos perdem a sensibilidade ocasionada pelo embotamento dos seus sentidos. Sentem-se à vontade no que é podre, chegando a estranhar os que não compartilham dos seus atos e pensamentos.
A situação de risco em que vivem esses homens parece bastante óbvia, mas o segundo está em perigo infinitamente maior, pois enquanto o homem no lixo pode perder a saúde, o homem no pecado, além da saúde, pode perder a paz, os bens, a família e, pior de tudo, a vida eterna.
Para um coração insensível os apelos podem ser inúteis, mas assim mesmo vou fazê-lo, reproduzindo as palavras do profeta: "Lavai-vos, purificai-vos, tirai a maldade de vossos atos de diante dos meus olhos; cessai de fazer o mal. Aprendei a fazer o bem... Vinde, diz o Senhor..."

A serviço do Mestre,          

               

Pr. Jenuan Lira

terça-feira, 22 de maio de 2012

A PIOR FORMA DE EGOÍSMO


As palavras do pai foram como uma espada a dilacerar o coração da criança de apenas 8 anos de idade: “Filho, papai não vai mais morar com a mamãe. Papai vai morar noutra casa”.  Sem conseguir aprofundar a conversa, mas com a voz embargada, o menino perguntou: “Por que, papai? Eu não quero que você vá embora”. E começou a chorar. Era de partir coração de um pai... se ainda houvesse sensibilidade. Neste caso não havia, e o pai insiste em querer dar ao filho uma razão sem razão: “Filho, papai e mamãe não se amam mais... mas eu queria saber com quem você quer ficar, com papai ou com mamãe?”. E o garotinho respondeu sem pensar um instante: “Quero ficar com os dois”. Mas não adiantou. O egoísmo já havia dominado o coração. Nem as lágrimas do filho faziam diferença.
            Noutra situação, estou numa praça e vejo a mãe e três crianças se aproximando. O pai, que esperava dentro do carro, saiu para receber a família.         Correndo na frente, vinha a filha menor... uns 7 aninhos. Dava para notar a felicidade dela em poder abraçar o pai. Era cedo da manhã, e evidentemente ele não dormira em casa. Esse abraço foi o que faltou antes de dormir. Talvez, a mãe a tenha consolado dizendo: “amanhã de manhã vamos encontrar o papai”. A tristeza noturna do seu coraçãozinho não posso mensurar, mas a alegria vibrante do encontro matinal com o pai podia ser vista mesmo por alguém que observasse de longe, como era o meu caso. Entre a mãe e o pai a saudação foi monossilábica, um simples oi. As outras filhas um pouco mais velhas pareciam indiferentes. Certamente a dor da distância não se vencia com um encontro de alguns minutos no banco de uma praça.
            O pai abraçou afetuosamente a filha menor, que logo sentou no seu colo. Ele beijava a filha que falava sem parar. Talvez o atualizando acerca dos acontecimentos em casa, tentando fazê-lo participar um pouco da vida familiar. Claramente ela se esforçava para ser o elo na família despedaçada. Mas era uma luta solitária. Entre o casal não tinha a menor afeição, e as outras crianças não davam uma palavra. Bem que o pai tentava abraçar as outras, mas elas se esquivavam. Então, ele compensava abraçando a pequena.
Já vi pais que abandonam seus filhos e se consolam com a frase paliativa que alguns terapeutas (muitos que também abandonaram seus lares) cunharam para aliviar o peso na consciência: Tempo de qualidade. Chegam a tentar defender a tese absurda de que filhos de pais separados que tem tempo de qualidade com seus pais, mesmo que seja por algumas horas na semana, não sofrem os traumas da separação. Esses são realmente os ditos “sábios” que aos olhos da Palavra de Deus são loucos. Não existe fórmula nenhuma que faça com que uma criança vivendo distante dos seus pais não sofra horrivelmente.
            O que é isso? Por que tantos lares se desfazendo? A Bíblia responde dizendo que nos últimos dias os homens iriam se tornar egoístas, insensíveis, sem amor pela família (2Tm 3.1-3; Rm 1.31). Eis a cena da nossa sociedade. Os homens são assim, e ainda são aplaudidos por procederem dessa maneira.
            Enquanto isso, centenas de crianças continuam clamando pelo retorno dos seus pais, pela continuação da família, pela bênção de irem dormir sabendo que papai e mamãe estão dormindo juntos. Há dificuldades na vida a dois? Certamente. Mas nada que esteja acima do poder de Deus, nada que justifique o sofrimento de uma criança que em lágrimas diz: “Não vá embora, papai”.
                       
            A serviço do Mestre,
            Pr. Jenuan Lira.

O MELHOR PRESENTE PARA A MÃE


Dia das mães representa dois desafios para pais e filhos. Além da decisão acerca do tipo de presente, temos o dilema acerca de onde comprá-lo. Onde quer que vamos, as lojas estarão cheias, pois todos querem, com razão, homenagear suas mães.
            Lamentavelmente, em muitos casos, o presente dado às mães na verdade é uma forma de alívio de consciência. Uma espécie de compensação pela distância e desprezo com que as mães são tratadas ao longo do ano.
            Por outro lado, mesmo que o presente não seja para alívio e compensação, achar um presente que esteja à altura do amor de mãe é tarefa árdua. Todos querem fazer o melhor dentro das suas possibilidades, e às vezes até acima delas.
            A Bíblia nos ajuda a encontrar o melhor presente. “Honra a teu pai e a tua mãe (que é o primeiro mandamento com promessa), para que te vá bem, e sejas de longa vida sobre a terra” (Efésios 6.2-3). Não existe presente comparável à honra que damos a nossas mães. Honra significa tratar com respeito e dignidade, demonstrar cuidado e consideração. Isto não apenas em palavras, mas principalmente em ações.
            O presente da honra é especial para as mães e compensador para os filhos. Deus preza tanto por esse relacionamento que faz uma promessa especial. Quem honra sua mãe terá uma vida plena, pois Deus o recompensará.
            Muitos filhos ficam procurando agradar suas mães neste dia dando coisas materiais que logo se acabam. Ao invés disso deveriam determinar em seus corações que serão melhores filhos, prontos para demonstrar todo carinho, respeito e amor por suas mães. Esse presente não se encontra em lojas, mas no coração que ama a Deus e entende seu dever de filho.
            No livro de Provérbios 23.22 temos outro conselho que não pode ser esquecido: “Ouve a teu pai, que te gerou; e não desprezes a tua mãe, quando ela envelhecer”. Poder ter a mãe ao seu lado durante a velhice não deve ser jamais um peso, mas um grande privilégio. Mas infelizmente alguns desprezam suas mães quando notam que a velhice está chegando. Nesse tempo de limitações, nossas mães talvez vão precisar que façamos por elas o que elas fizeram por nós. Se for o caso, que estejamos dispostos a cuidar delas alegremente.
O amor e cuidado das mães é o melhor espelho do amor de Deus por nós. Que possamos honrar a Deus por meio da honra que damos a nossas mães.
A serviço do Mestre,
Pr. Jenuan Lira.
            

ENTRE O PASSADO E O FUTURO


“Há caminhos que ao homem parecem direitos, mas ao final são caminhos que conduzem à morte” 
(Pv 16.25).
            
“O passado não existe, o futuro você decide”. Como em outras ocasiões, a frase no vidro traseiro do carro me chamou a atenção. Mas palavras e frases são como parafusos, soltas significam muito pouco. Precisam estar agarradas a um contexto que lhes forneça sentido. Neste caso o contexto era uma sigla: PMDB.
            Matei a charada: o partido está lançando mão do mirabolante marketing de campanha, a fim de angariar votos. Está se beneficiando de uma contradição da chamada liberdade democrática. Segundo nossos preceitos civis, nas urnas o cidadão terá o direito de escolher seus representantes. Mas o marketing tem também o seu direito de dar uma mãozinha na hora do exercício da 'liberdade' de escolha. Por isso, o resultado eleitoral pode não representar exatamente o que o povo queria, mas a melhor imagem que foi vendida durante a campanha. Quando isso acontece, e acontece com frequência, pode-se dizer que os eleitores estarão votando na melhor agência de propaganda, não no melhor candidato.
            Mas, e quanto à frase? O passado não existe mesmo? Há controvérsias, pois o passado não existe, mas subsiste nos seus efeitos. Fatos não voltam, mas deixam consequências. Conforme as palavras acima proferidas por Salomão, em certos momentos, os homens podem se enveredar por caminhos tortuosos, que são sementes de morte no futuro. Assim, quando o relógio der mais uma volta transformando o passado, o presente e o futuro no seu antecessor imediato, as decisões passadas continuarão a brotar em frutos amargos que podem perdurar eternamente, misturando as extremidades do tempo.
            E quanto ao futuro? Bem, esse está totalmente fora do nosso controle. Mesmo que os políticos digam o contrário. Neste caso, a sabedoria popular é mais segura: “O futuro a Deus pertence”. Ainda bem, pois quando os homens querem dominar o futuro, o presente se torna um desastre. O que o futuro nos reserva, só Deus realmente sabe. Isso vale para a política e para os políticos. E não precisamos ir longe. Quem poderia, há quatro anos, imaginar o futuro do ex-presidente Lula? Com sua incontestável capacidade de inclinar a opinião popular, era certo que sua influência política ditaria os rumos da nação por vários anos. Infelizmente, as previsões otimistas não estão se confirmando, pelo menos no pleito que se aproxima. Um câncer na garganta abateu o vigor do presidente, atingindo sua principal arma: a voz. Em recente aparição pública, Lula precisou ser auxiliado para chegar ao assento central da grande mesa, na cerimônia realizada em sua homenagem. Sequer teve forças para discursar em pé. A criatividade e emotividade do improviso, suas marcas registradas, também não funcionaram. O presidente teve que ficar preso ao papel. Se os homens tivessem poder sobre o futuro, tais histórias não existiriam.
            Ao invés de lamentar o passado ou tentar manipular o futuro, os homens deveriam se concentrar no presente. É apenas no presente que se acham as possibilidades de agirmos no tempo. Não podemos ressuscitar o passado, mas podemos aprender a lidar com suas consequências. As palavras de Jesus à mulher pega em adultério ensinam essa verdade: “Vá e não peques mais”. Ele está aconselhando que a mulher aproveite a graça do Seu perdão quanto ao passado e viva diferente no presente. Mas não podemos demorar. É preciso diligência, pois o presente se torna em passado muito rapidamente, pois “tudo passa rapidamente, e nós voamos” (Salmo 90.10).
            O que os homens precisam é lembrar que entre o passado e o futuro está o presente. E acima de tudo e de todos está Deus. O tempo está nas Suas mãos, pois foi criado por Ele. Seu poder é tão grande e Sua graça tão infinita, que Ele pode reconstituir nossa história, apagando as marcas de um passado de trevas, levando-nos para um futuro de glória. Por isso, bem faremos se ouvirmos novamente as palavras de Salomão: “Reconhece-o em todos os teus caminhos, e ele endireitará as tuas veredas” (Pv 3.6).
            “Hoje é o dia que fez o Senhor”. Portanto, “Hoje se ouvirdes sua voz, não endureçais o vosso coração”.

            A serviço do Mestre,
            Pr. Jenuan Lira.

O COLORIDO DA VIDA


A senhora não tinha notado o problema até que chegou a um conhecido bosque cheio de eucaliptos. De outras visitas, sabia que o agradável odor rescendia por toda parte. Era uma delícia encher os pulmões com a essência medicinal exalada pelas árvores. Mas dessa vez foi diferente. As árvores estavam lá, exuberantes como sempre, mas o perfume tinha sumido. E esse sumiço não era pequeno, pois quando o cheiro não é bom, os olhos não se agradam.
           
 Foi aí que ela percebeu que a recente virose tinha lhe roubado o olfato e afetado o paladar. Recordando o episódio, ela compartilhou: “Pastor, não tem coisa pior. Sem olfato e sem paladar a comida, por melhor que seja, parece isopor”. E acrescentou: “Nossos sentidos é que dão o colorido à vida”.
            Nem sempre somos gratos pelos nossos 5 sentidos. Mas deveríamos fazê-lo constantemente. Sem os sentidos, deixamos de desfrutar parte da beleza que nos cerca. A vida fica meio cinza.
            No entanto, a insensibilidade física não é a maior perda que uma pessoa pode sofrer. Na verdade, a insensibilidade espiritual é ainda mais preocupante, pois além da dimensão material, no mundo se manifestam os tons vívidos da realidade espiritual, fruto da ação caprichosa do Criador. Com a visão material vemos a beleza do céu, com a visão espiritual percebemos, além disso, a glória de Deus manifesta no mesmo céu. É uma percepção diferente, ou como se diz nos termos da informática, um ‘upgrade’. Sem percepção espiritual a vida fica realmente sem graça.
            O apóstolo Paulo nos diz a razão da insensibilidade espiritual que afeta todos os homens. Em Efésios 4.17-19 ele diz: “Isto, portanto, digo e no Senhor testifico que não mais andeis como também andam os gentios, na vaidade dos seus próprios pensamentos, obscurecidos de entendimento, alheios à vida de Deus por causa da ignorância em que vivem, pela dureza do seu coração, os quais, tendo-se tornado insensíveis, se entregaram à dissolução para, com avidez, cometerem toda sorte de impureza”. Sem o temor do Senhor, o homem vive na ‘futilidade’ dos seus pensamentos. Isto é o mesmo que ‘obscuridade de entendimento’. Sem a luz de Deus, a compreensão fica impedida, a mente imersa na ignorância e o coração endurecido. A soma desses fatores desemboca na insensibilidade, que leva à impureza, como diz o texto acima.
            Em nosso estado natural, todos chegamos a esse mundo com uma “má formação espiritual congênita”. Essa deformidade afeta diretamente os nossos sentidos espirituais, principalmente a visão. Mas quando a luz de Deus raia ao nosso redor, os olhos se abrem para a beleza da vida e começamos a perceber os contornos da eternidade.
            Nunca fui cego, mas lembro de uma vez em que tive a visão restaurada. Enquanto estudava no seminário, notei a vista cansada e um desconforto durante as leituras. Nas férias fiz meu primeiro exame oftalmológico, que acusou a necessidade de um par de óculos. Eram necessários alguns dias até ficarem prontos. Passado o prazo, finalmente chegou a encomenda do laboratório óptico. Era por volta das três horas da tarde e eu estava debaixo de uma bela árvore em frente ao refeitório. Nunca vou esquecer. Assim que coloquei os óculos, os galhos e folhas da árvore ganharam nova vida. Eu podia ver seus contornos delicados. Minha vista estava curta, mas eu não sabia, pois nunca antes havia usado óculos. Minha visão precisava ser reparada.
            Tudo isso combina bem com a realidade espiritual do encontro com Cristo. Antes de conhecê-lo, não podíamos imaginar a beleza de que estávamos sendo privados pelas trevas que nos cercavam. Mas quando Aquele que é a Luz do mundo acendeu Sua glória dentro de nós, imediatamente um novo horizonte despontou diante dos nossos olhos. A natureza e a vida ganharam novos contornos de exuberante doçura. Passamos a ter sensibilidade espiritual. Pela Sua graça, vencemos a dureza de coração.
            Sem os sentidos naturais a vida perde o brilho. Sem os sentidos espirituais, a vida perde a razão. Louvado seja Aquele que nos tirou das trevas para sua maravilhosa luz.
            
A serviço do Mestre,
            
Pr. Jenuan Lira.