terça-feira, 27 de novembro de 2012

CRUELDADE FRANCISCANA



“Se vós, porém, vos mordeis e devorais uns aos outros,
vede não sejais mutuamente destruídos” (Gl. 5.15)

 Nada poderia ser mais estranho e fora de propósito do que o duelo mortal entre dois santos. No entanto, a chamada “guerra santa” não é um privilégio oriental. No interior do Ceará, neste momento, dois santos estão se degladiando.  
Trata-se da briga entre São Francisco de Canindé e Santo Antônio de Caridade. São Francisco, quem diria, sentiu-se ferido em seu orgulho ao notar que os devotos de Santo Antônio estavam lhe edificando uma estátua de admirável tamanho. Vendo-se, assim, sob o perigo iminente de perder espaço no mercado da fé, São Francisco, sem a menor caridade, mobilizou seus súditos a fim de desferirem um golpe humilhante no desprevenido Santo Antônio. Foi assim que, quando a estátua de Santo Antônio estava no ponto de receber a cabeça, São Francisco interditou a obra. Sem piedade. Por isso, o desejo dos devotos de Santo Antônio redundou em severa humilhação ao santo, uma vez que sua estátua se reduziu a um mero tronco decapitado.  Claro que essa não é uma atitude muito santa, mas foi assim que tudo ocorreu e os restos de Santo Antônio continuam na cidade como prova da fúria de São Francisco. Pobre Antônio! Se com todas as partes afixadas não passaria de mero ídolo inerte, imagine agora, sem a cabeça, que se encontra largada no chão, servindo de abrigo para formigueiros. Além da vergonha de não ter podido iniciar seu reduto de fiéis, Santo Antônio ainda poderá ser conhecido nas gerações vindouras como uma figura folclórica, fazendo dupla com a famosa mula-sem-cabeça. 
É interessante que à primeira vista, os santos brigões têm muitas semelhanças. Suas  respectivas cidades começam com a mesma letra. Têm estatura parecida (causa do ressentimento de franciscano), e deveriam ter o mesmo olhar sem vida, congelado na contemplação do horizonte. Se há tanto em comum, por que não resolveram seus dilemas de uma maneira mais santa, sem precisar lançar mão de medidas violentas? Deixar o pobre Santo Antônio sem cabeça é humilhante demais? Onde foi parar a caridade para com o santo de Caridade?  Afinal, o amor, a compreensão, a humildade e a paz não são lemas da oração franciscana? Não foi São Francisco que pediu... “Senhor, fazei-me um instrumento da vossa paz”?
            A triste briga dos ditos santos do interior do Ceará nos ensina que quando o orgulho domina o coração, até os santos são capazes de cometer atrocidades. Perdem a compaixão, se esquecem da misericórdia, desprezam a caridade e se acham no direito de desferir golpes mortais contra aqueles que lhes tenham ofendido. 
            Essa história nos remete aos santos segundo a Bíblia. Conforme as Escrituras os santos não são mortos canonizados pelos oportunistas decretos humanos, mas são todos os que confessam a Jesus como seu Senhor e Salvador, recebem o Espírito Santo como selo da sua redenção e são chamados a viver uma vida separada do pecado, buscando a paz e esforçando-se por alcançá-la. Mas infelizmente os santos nem sempre agem de maneira santa. Como Paulo advertiu aos gálatas, mesmo uma comunidade de santos pode se tornar um ambiente selvagem e hostil, onde seus habitantes procuram morder e devorar uns aos outros.
Por isso, se em alguma comunidade de santos reais, salvos por Cristo, a crueldade franciscana se manifestar, sem a menor piedade, infelizmente não terá sido mera coincidência... Essa história se repete constantemente...  Infelizmente.
            A serviço do Mestre,
            Pr. Jenuan Lira.

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